Pedro Rodolfo Bodê de Moraes

Por Aknaton Toczek Souza (UFPR) e
Mariana Corrêa Azevedo (UFPR)

Pedro Rodolfo Bodê de Moraes nasceu no Rio de Janeiro em 22 de setembro de 1960. Cresceu em São João do Meriti, na Baixada Fluminense. Seu pai foi taxista e sua mãe professora da rede pública de ensino, ele o mais velho entre três filhos. Ainda jovem, estudante da escola pública, participou ativamente do movimento estudantil e de grupos católicos contra a ditadura e, em especial, da teologia da libertação. Tal experiência ecoou durante toda a sua trajetória e o conduziu até as Ciências Sociais. A vivência na Baixada Fluminense sempre estava em suas histórias, lá conviveu com um advogado criminalista amigo de sua família, e foi quando a relação do Sistema de Justiça e os Direitos Humanos foram apresentados ao Pedro, objetos estes que se tornaram centrais em suas análises futuras.

Em 1980 começa a graduação em Ciências Sociais na Universidade Federal Fluminense, tomando parte constantemente em grupos de pesquisa e de extensão. Teve entre seus professores Simone Guedes e Roberto Kant de Lima, dentre outros, pelos quais nutria profunda admiração e amizade. Em 1985 inicia a sua carreira docente – profissão comum à de seu irmão e irmã mais novos –, lecionando em escolas públicas e particulares.

Entra no Museu Nacional da UFRJ em 1988 como aluno do mestrado em Antropologia Social, sob a orientação do professor Dr. Afrânio Raul Garcia Jr. Em tal oportunidade pesquisou a obra de Monteiro Lobato e a sua relação com a criação de editoras nacionais. Adiante vai deixando progressivamente a história do pensamento social sem contudo, perder sua aproximação com a antropologia – cujo início atribuía à Professora Simone Guedes, ainda na época da UFF. Estes anos foram decisivos para a construção de sua sensibilidade sociológica que aflora ainda na década de 1990 em Curitiba, Paraná.

Em 1992 Pedro Bodê torna-se professor da Universidade Federal do Paraná, no Curso de Ciências Sociais, na cadeira de Sociologia Brasileira. Em 1995 conclui seu mestrado. Na cidade de Curitiba se fixa e passa a atuar decisivamente para a melhoria do curso de Ciências Sociais, sempre ativo nos debates de reformas no currículo, criação de revistas, atividades de extensão e de especialização. Também ativo na instituição da pesquisa científica, em nível de Pós-Graduação em Sociologia, em 1995 para o mestrado e em 2004 para o doutorado.

Ao fim da década de 1990, participa de uma pesquisa nacional organizada pela UNESCO sobre “Juventude, Violência e Cidadania”, que resulta em um livro de 1999 intitulado: “Os jovens de Curitiba: esperanças e desencantos”. A experiência foi um divisor de águas, conduzindo-o cada vez mais para as pesquisas vinculadas às violências. Dentre vários pontos significativos, destacamos a incorporação das visões dos policiais e outros agentes do Estado sobre os fenômenos da violência, sendo pioneiro nesse tipo de abordagem. Com olhar atento às injustiças e uma aguçada imaginação sociológica – fruto do artesanato intelectual que defendia fervorosamente como prática –, foi aprovado no doutorado no IUPERJ em 1999, sob a orientação do professor Dr. Luiz Antônio Machado da Silva, por quem o profundo respeito e afeto duraram toda a vida. Com ele realizou seu estágio pós-doutoral concluído em 2013.

Obtém o título de doutor em Sociologia em 2003 com a tese “Punição, encarceramento e construção de identidade profissional entre agentes penitenciários”, convertida posteriormente em livro. Sua pesquisa foi seminal nos estudos penitenciários, sobre segurança pública e as carreiras e profissões estatais, em especial aquelas responsáveis pelo controle social exercido através da punição. Realiza um curso sobre Toxicomania em 2004. Já envolto por diversos interesses de pesquisa na intersecção da violência, da segregação e dos Direitos Humanos, funda em 2005 na UFPR o Centro de Estudos em Segurança Pública e Direitos Humanos (CESPDH/UFPR) – com o professor Dr. José Antônio Peres Gediel (PPGD/UFPR). Espaço vivo em que Pedro liderava e atuava juntamente com dezenas de outros pesquisadores e estudantes.

Ainda na primeira década do século XXI foi presidente da Comissão Estadual da Verdade no Paraná. A experiência foi marcante em sua vida, narrada em um misto de tristeza e desesperança. Já na década de 2010, Pedro Bodê participou de diversas investigações e pesquisas, como professor permanente dos Programas de Pós-Graduação em Sociologia e em Direito da UFPR. Teve como objeto de seu olhar Juventudes, Segregação, Drogas, Militarização, Sistema de Justiça Criminal, suas instituições e agentes. Sempre estimulando em seus orientandos e orientandas um olhar sagaz, arguto e sensível aos fenômenos estudados.

O professor Pedro Bodê faleceu no dia 27 de novembro de 2021. Nos últimos anos manteve-se ativo, criando novas redes e fortalecendo outras. Enlutou-se diante do falecimento da sua professora Simone Guedes e posteriormente do professor Luiz Antônio Machado da Silva durante a pandemia de Covid-19; período ao qual soube se adaptar – não sem suas críticas mordazes e o seu humor encantador –, lecionando, coordenando e participando de inúmeras atividades. Sua última aula foi em 12 de novembro de 2021, na disciplina de “Leituras clássicas e contemporâneas”, cuja leitura do dia era dos sociólogos Pierre Bourdieu e Anthony Giddens.

Seu legado permanece em todos aqueles e aquelas que puderam conviver com ele e conhecer sua produção científica. Seus inúmeros alunos, orientandos e demais convivas foram tocados pelos encontros em que apreendíamos suas lições nas mínimas interações. Essas sempre carinhosas, acolhedoras e pertinentes. Pedro orientava pela vivência que inspirava a humildade, a solidariedade e a ascese científica.

Sugestões de obras do autor:

MORAES, P. R. B.. O jeca e a cozinheira: raça e racismo em Monteiro Lobato. Revista de Sociologia e Política, Curitiba/PR, n.8, p. 99-112, 1997.

MORAES, P. R. B.. Preconceito, invisibilidade e violência racial em Curitiba. Revista de Sociologia e Política, Curitiba/PR, n.13, p. 1-24, 1999.

MORAES, P. R. B.. Punição, encarceramento e construção de identidade profissional entre agentes penitenciários. 1a.. ed. São Paulo: Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCrim, 2005.

MORAES, P. R. B.; SALLAS, A. L. F. ; BEGA, M. T. S. ; VILLA, R. A. D. Os jovens de Curitiba: esperanças e desencantos (juventude, violência e cidadania). Curitiba: Editora da Universidade Federal do Paraná, 2008.

SOUZA, A. T.; ROSA, P. O. ; MORAES, P. R. B. Emprendedorismo de si e emprendedorismo moral na magistratura: as representações dos juízes de direito de Ponta Grossa sobre os “usuários de drogas”. In: Pablo Ornela Rosa; Humberto Ribeiro Jr.; Luciana Souza Borges. (Org.). Perspectivas em Segurança Pública. 1ed.Florianópolis: Insular, 2016, v. 1, p. 105-132.

BORDIN, M.; MORAES, P. R. B. De. A ideia de Nação e a Hipermilitarização: aspectos sociológicos e políticos. Revista NEP – Núcleo de Estudos Paranaenses da UFPR,. v. 3, n. 3, p. 284–294, 2017.

SOUZA, A. T. ; Camargo, G. M.; MORAES, P. R. B. Por uma sociologia das drogas. In: ROSA, Pablo Ornelas; BODÊ DE MORAES, Pedro; SOUZA, Aknaton Toczek; MORAES, Maristela.(Org.). Drogas e Sistema de Justiça Criminal. 1ed.Vitória: Editora Milfontes, 2020.