Miriam Adelman

Por Milena Costa de Souza (Unespar)

Miriam Adelman (1955. Milwaukee, Winsconsin, EUA) é pesquisadora, poeta, escritora, tradutora, professora associada do Programa de Pós-graduação em Sociologia (PGSOCIO) e do Programa de Pós-graduação em Letras (PGLETRAS), ambos da Universidade Federal do Paraná (UFPR). De origem judaica e pais envolvidos no movimento comunista, questionou desde cedo seu lugar no mundo e, com isso, as possibilidades de se cruzar as fronteiras étnicas, nacionais e criar uma narrativa de si em meio a esses movimentos.

Aos 19 anos viajou para o México com uma de suas irmãs. A viagem que era para durar algumas semanas se estendeu por anos. Ao cruzar a fronteira, se deparou com um mundo novo e a Sociologia, que ainda não aparecia no seu horizonte de possibilidades profissionais, surgiu como um grato encontro ao procurar formação no campo das humanidades, que culminou no seu ingresso na Universidad Nacional Autónoma de México (UNAM).

Dentre os professores que mais marcaram sua trajetória na UNAM estavam Raquel Sosa, Maria Angeles Lizon Ramon e Julian Meza, que contribuíram para a sua formação sociológica e sua jornada entre a teoria social clássica e contemporânea. O contato com a teoria feminista e as questões de gênero – que depois viriam a ser centrais em suas pesquisas sociológicas – começou fora da universidade, ao frequentar um grupo de discussão feminista conduzido pela reconhecida intelectual e ativista Martha Lamas. Eram os anos 1970 e os encontros entre mulheres para conversar sobre questões de gênero se espalhavam pelo mundo. No grupo de Lamas conheceu Mary Goldsmith que estava fazendo doutorado e viria a se tornar uma importante interlocutora.

A primeira experiência como docente também foi no México ao realizar seu estágio social obrigatório. Junto com Goldsmith e sob supervisão de Lamas, estruturou e lecionou a disciplina Sociologia da Mulher. Naquela época, ainda não estava consolidado no léxico o conceito de gênero na academia, de maneira que Sociologia da Mulher foi ministrada na perspectiva de dar visibilidade para as mulheres na história e nas relações sociais.

No final dos anos 80 retornou aos EUA para ingressar no programa de pós-graduação em Sociologia na New York University, que resultou no título de M.Phil em Sociologia obtido em 1991. Ali encontrou um ambiente vibrante que a permitiu participar de encontros com Pierre Bourdieu, Zygmunt Bauman, Agnes Heller e Cornelius Castoriadis. Foi na NYU que também teve contato com o Interacionismo Simbólico e a Escola de Chicago, sobretudo a partir das aulas do Professor Edwin Schur, e oportunidade de aprofundar o pensamento sobre mulheres, gênero e o sistema socioeconomico mundial com a professora visitante Valentine Moghadam.

Sua estada em NY não foi longa e a fronteira que Miriam Adelman começou a cruzar entre os Estados Unidos e a América Latina durante a sua graduação seria cruzada, nos anos seguintes em direção ao Brasil. Em 1992 ingressou como professora do Departamento de Sociologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e o Brasil tornou-se sua nova casa.

Na UFPR foi uma das fundadoras do Núcleo de Estudos de Gênero. Junto com Ana Paula Vosne Martins e demais professoras da universidade, abriu as portas para uma nova geração, ampliando o debate acadêmico no Departamento de Ciências Sociais, no Setor de Cîências Humanas, Letras e Artes (SCHLA) e na comunidade da UFPR em geral. O Núcleo da UFPR mirou, dentre outras referências nacionais, as iniciativas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). A parceria institucional entre essas universidades fez com que Miriam Adelman escolhesse a UFSC para realizar seu doutorado sob orientação de Miriam Grossi no Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas.

Em 2009 publicou “A voz e a escuta. Encontros e desencontros entre a teoria feminista e a sociologia contemporânea”. O livro, fruto de sua pesquisa de doutorado, é leitura fundamental para todos que desejam se aprofundar nas discussões contemporâneas e refletir sobre como as questões de gênero contribuíram para o aprofundamento sobre nosso entendimento de Modernidade e Pós-Modernidade.

Ao longo dos anos Miriam realizou pesquisas dentro de várias áreas e temáticas da sociologia incluindo gênero, corpo, as mulheres nos esportes equestres, relações humano-animais, a feminilização dos circuitos migratórios, movimentos de contracultura, entre outros. A trajetória de Miriam Adelman é marcada por um processo contínuo de criação de redes entre geografias e pessoas. Em seu primeiro pós-doutorado, realizado na Universidade de Barcelona em 2009, pesquisou as mulheres do mundo equestre espanhol e suas subjetividades corporificadas. Seu segundo pós-doutorado foi realizado em 2016 na École des hautes études en sciences sociales (EHESS) sob a supervisão da Dra Mônica Raísa Schpun. Na ocasião, cruzou o tema de cultura equestre brasileira e migração internacional, com um estudo sobre trabalhadores do mundo do turfe brasileiro que fazem do Reino Unido seu local de trabalho e novo lar. Estudiosa das relações entre humanos e equinos inicialmente desde o prisma de gênero e esporte, a partir da segunda década do novo milênio sua participação em redes internacionais a conectou com novas interfaces, no cada vez mais dinâmico campo de relações humano-animais. Nesse contexto, coordenou o Grupo de Trabalho “Relações Humano-animais: passados, presentes e futuros possíveis” nas reuniões anuais da ANPOCS junto a Profa Dra Andréa Osório (UFF).

Os estudos literários também acompanham a trajetória de Adelman. Uma paixão antiga que ganhou maior espaço na sua atividade acadêmica ao longo dos anos 2000 a partir de traduções, pesquisas e sua filiação ao Programa de Pós-graduação em Letras (PPGLet) da UFPR.

Orientadora generosa inclui frequentemente seus orientandos em publicações acadêmicas, encorajando-os a escrever e estendendo a mão mais experiente para guiar estudantes em suas trajetórias. A trajetória de Adelman é sem dúvida alguma multidisciplinar, movida pela curiosidade e paixão pelo conhecimento, ela atravessa fronteiras físicas e disciplinares. Sua frase “Se você se mantém aberto olhando para o mundo, o mundo te leva” resume sua posição guiada pela imaginação sociológica, vontade de aprender e ensinar.

Sugestão de obras da autora:

ADELMAN, Miriam; PAULA, Anna Beatriz. (Org.). Lentes, pincéis e páginas: discursos de mulheres. Curitiba: Editora da UFPR, 2020.

ADELMAN, Miriam. Found in Translation. São Paulo: Nosotros Editorial, 2020.

ADELMAN, Miriam; THOMPSON, Kirrilly. (Org.). Equestrian Cultures in Global and Local Arenas. Heidelberg: Springer, 2017.

ADELMAN, Miriam; KNIJNIK, Jorge D. (Org.). Gender and Equestrian Sport: Riding around the World. Heidelberg: Springer, 2013.

ADELMAN, Miriam; CORREIA, Amélia; RUGGI, Lennita; TROVÃO, Ana Carolina.R. (Org.). Mulheres, homens, olhares e cenas. Curitiba: Editora da UFPR, 2011.

ADELMAN, Miriam. A voz e a escuta: encontros e desencontros entre a teoria feminista e a sociologia contemporânea. São Paulo: Editora Blucher Acadêmico, 2009

ADELMAN, Miriam; SILVESTRIM, Celsi. B. Gênero plural: um debate interdisciplinar. Curitiba: Editora UFPR, 2002.