Antônio Luiz Paixão

Por Luciana Teixeira de Andrade (PUC Minas)

Antônio Luiz Paixão foi um sociólogo mineiro nascido no ano de 1947 em Contagem, município da Região Metropolitana de Belo Horizonte, e falecido em 1996 aos 49 anos. Como muitos sociólogos esteve envolvido com a política de esquerda na juventude. Primeiro, uma breve passagem pelo Partido Comunista e depois pela Ação Popular (AP). Fez sua graduação em Ciências Sociais na UFMG, mestrado (1975) e doutorado na Universidade de Stony Brook em Nova Iorque. Apesar de grande pesquisador, a conclusão da sua tese de doutorado não lhe parecia à época, uma prioridade. No IUPERJ, fez novamente os créditos e escreveu a maioria dos capítulos. Mas, para essa conclusão, faltou-lhe tempo.

Sua carreira dividiu-se, durante os primeiros anos, entre a FAFICH – UFMG e a Fundação João Pinheiro, importante centro de pesquisa onde teve início as suas pesquisas sobre criminalidade. Na FAFICH ensinava principalmente teoria sociológica clássica e contemporânea, mas também deu cursos de pós-graduação sobre as questões da ordem e da criminalidade, transitando pelos autores da sociologia e da ciência política.

Com sólida formação americana, seu conhecimento sociológico ia dos pioneiros da Escola de Chicago aos mais contemporâneos do interacionismo simbólico e da etnometodologia. Já a partir da década de 1970, formou muitos sociólogos nessas novas correntes. À formação de pesquisadores veio se somar o que o faria uma referência nacional: os estudos pioneiros sobre o crime no Brasil. Inicialmente em uma pesquisa compartilhada com Edmundo Campos Coelho sobre os sistemas penitenciários de Minas Gerais e do Rio de Janeiro (1984), e depois sobre organização policial e crimes em Belo Horizonte e Minas Gerais.

Foi na Fundação João Pinheiro que Paixão começou os estudos sobre criminalidade, assim como a sua participação nos cursos de formação de policiais, outra ação pioneira. Nessa época temas como o crime não eram bem vistos por uma parte da comunidade universitária, muito menos colaborações com a polícia. As críticas iam da acusação de ser de direita à irrelevância do tema. Bom lembrar que se trata de um período em que a influência marxista era muito forte nas ciências sociais, a criminalidade ainda começava a crescer e a polícia em geral era associada à ditadura militar.

Parte de sua produção não chegou a ser publicada, como os capítulos da tese de doutorado (lidos em cópias xerox por muitos estudiosos do crime), outra parte foi publicada em revistas que não estão facilmente disponíveis hoje. Há textos breves, mas muitos interessantes, como os que ele escrevia como esquemas de aula. As aventuras do conhecimento: Notas sobre o desencantamento do mundo nas ciências sociais (Revista Brasileira de Sociologia, vol 8, número 19, 2020) e A etnometodologia e o estudo do poder: notas preliminares (1986) são dois exemplos. Sua maior produção foi sobre crimes, mas dois textos sobre teoria merecem ser lembrados: o artigo A teoria geral da ação e a arte da controvérsia (1989) sobre Parsons e Temas contemporâneos de sociologia clássica (1991), escrito com Antônio Augusto Prates e Renan Springer Freitas, publicado pela editora da FAFICH. Entre os estudos do crime dois se destacam, A organização policial numa área metropolitana (1982) que inaugura no Brasil os estudos sociológicos sobre a polícia, numa perspectiva etnomedodológica, e um pequeno livro, Recuperar ou punir? Como o estado trata o criminoso (1987), cuja origem foi a pesquisa realizada nos presídios mineiros.

Uma minibiografia do Paixão não poderia deixar de falar da sua personalidade. Na universidade e na Fundação João Pinheiro cultivou grandes amigos e admiradores de diferentes áreas e tipos, até porque suas amizades, assim como as escolhas teóricas, tinham pouco viés ideológico. Há, no entanto, uma parte importante da sua vida e da sua sociabilidade que acontecia nos bares com uma multiplicidade de amigos, grande parte composta por estudantes de ciências sociais, mas outra por pessoas das artes, da política e da boemia. Com todos tinha algo para conversar, em geral coisas divertidas, pois adorava uma gargalhada e boas piadas. Sempre muito antenado com o que acontecia no mundo, não lhe faltavam assuntos interessantes. Assim como na sala de aula falava de coisas inusitadas ao pensamento mais convencional, nas conversas de bares as situações mais cotidianas e banais eram interpretadas sociologicamente. Era sociólogo independente do ambiente, mas sempre sem perder o tom. Essa personalidade meio underground e com um afinado senso crítico, tinha também seus desafetos, para os quais atribuía apelidos muito divertidos. Era querido, mas não era uma unanimidade e nunca quis ser.

As marcas de sua trajetória intelectual são facilmente identificáveis nos seus orientandos, hoje profissionais, em parte pelo que foi dito e em outra porque foi um orientador de outros tempos, em que a formação demandava tempo. Sua morte foi profundamente sentida pela falta que fez e ainda faz. Alba Zaluar e Edmundo Campos dedicaram-lhe belas e afetivas homenagens. O livro As Ciências Sociais e os pioneiros nos estudos sobre crime, violência e direitos humanos no Brasil (2011), publicado depois da sua morte, dá a exata dimensão da sua importância pela fala dos pesquisadores ali reunidos.

Sugestões de obras do autor

PAIXÃO, Antônio Luiz. A organização policial numa área metropolitana. Dados. Rio de Janeiro, v. 25, n. 1, p. 63-85, 1982.

FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO. Caracterização da população prisional em Minas Gerais e Rio de Janeiro. 1984. 560 p. Disponível em: http://www.bibliotecadigital.mg.gov.br/consulta/verDocumento.php?iCodigo=47950&codUsuario=0. Acesso em: 20 nov. 2020.

PAIXÃO, Antônio Luiz. A etnometodologia e o estudo do poder: notas preliminares. Análise. & Conjuntura, v. 1, n. 2, p. 93-110, 1986.

PAIXÃO, Antônio Luiz. A teoria geral da ação e a arte da controvérsia. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 4, n. 11, p. 34-56, 1989/10. 1989.

PRATES, Antônio Augusto P; PAIXÂO, Antônio Luiz e FREITAS, Renan Springer. Temas contemporâneos de sociologia clássica. Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG, 1991.