Alice Rangel de Paiva Abreu

Jéssica Melo (GPSECC/USP)

Nascida em outubro de 1944 no Rio de Janeiro, Alice Rangel de Paiva Abreu é uma socióloga que merece reconhecimento por sua ampla contribuição na sociologia brasileira e sobretudo, em relação às temáticas de gênero, ciência e trabalho. Possui uma vasta produção bibliográfica e destacada participação em organismos internacionais que promovem a participação das mulheres no campo científico e dos saberes.

Formou-se em 1967 no curso de Ciências Políticas e Sociais na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). Cujo departamento havia sido fundado em 1954 pelo Padre Fernando de Bastos D’Ávila e levava o nome de Instituto de Estudos Políticos e Sociais, passando a oferecer cursos no ano seguinte, em 1955. Na época, ainda eram poucas as que tinham oportunidade de acessar o campo acadêmico no Brasil. No entanto, Alice e sua irmã ingressaram na graduação.

Ainda recém formada, candidatou-se ao mestrado em Antropologia do Museu Nacional (UFRJ), onde foi aprovada e, logo após o primeiro ano, interrompeu o curso para se mudar com o marido à Inglaterra. Com a chegada da maternidade no longínquo país, em 1971 Abreu conseguiu concluir o mestrado em Sociologia pela London School of Economics (LSE).

Sua formação na década de 1960 não havia aprofundado na problemática de gênero, pois havia pouca receptividade das produções nas universidades brasileiras. No entanto, de acordo com entrevistas concedidas pela professora, já havia certo interesse pessoal pelo tema. Assim, sua familiarização com a área de investigação se deu em Cambridge, quando teve contato com um uma grupo de pesquisa sobre trabalho em domicílio.

Ao retornar ao Brasil, em 1974, já com uma densa bagagem teórica dos feminismos ingleses, ingressou no Programa de Pós-graduação em Sociologia da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP) onde desenvolveu a pesquisa de doutorado sobre mulheres trabalhadoras. O trabalho foi orientado pelo professor Leôncio Martins Rodrigues, especialista em sociologia do trabalho. Posteriormente, a tese foi publicada em formato de livro pela Editora Hucitec sob o título de O Avesso da Moda: trabalho a domicílio na indústria de confecção (1986).

Um mês após a defesa foi aprovada no concurso para professora do Departamento de Sociologia do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde atuou ao longo de sua trajetória e ainda encontra-se vinculada como professora credenciada no PPGSA. Atualmente, Alice Abreu é Professora Emérita de Sociologia da mesma Universidade.

Ainda nos anos de 1987 e 1988, realizou pesquisa de pós-doutoramento na École des Hautes Etudes en Sciences Sociales (EHESS) com bolsa CNPq. Dez anos após, em 1998, realizou outra pesquisa com bolsa CAPES no Institute of Latin American Studies da University Of London (ILAS). Tem uma intensa participação em diversas bancas de doutorado e mestrado, além de comissões julgadoras de concurso docente. Orientando pesquisas sobre representação política de mulheres, sociologia do trabalho, trabalhadoras e militância sindical. Ministrou disciplinas na graduação e pós-graduação sobre: [i] Divisão Sexual do Trabalho; [ii] Sociologia Industrial e do Trabalho; [iii] Ensino, Sociologia e Antropologia; [iv] Estudo de Segmentos Urbanos; [v] Estrutura de Classe e Estratificação Social; [vi] Mercado de Trabalho Urbano e Segmentação da Classe Trabalhadora; [vii] Teoria Sociológica; [viii] Introdução à Sociologia além de outras.

Vale ressaltar outra faceta que ilumina ainda mais as contribuições da pesquisadora, e que foi a sua intensa imersão na comunidade científica brasileira através da participação em órgãos de apoio e financiamento à pesquisa. Entre os anos de 1999 à 2002, tornou-se vice-presidenta do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), dedicando-se, sobretudo, à área de cooperação internacional. Em janeiro de 2003, mudou-se para Washington para atuar como Diretora do Escritório de Educação e Ciência e Tecnologia da Organização dos Estados Americanos (OEA), trabalhando diretamente com os sistemas de ciência e tecnologia até o ano de 2006.

Nesse mesmo ano, tornou-se Diretora do Escritório Regional para América Latina e Caribe do ICSU – International Council for Science (2006-2010), organização não-governamental com o objetivo de promover e incentivar diálogos entre comunidades científicas, governos e a sociedade civil. Posteriormente atuou como Coordenadora Regional da Iniciativa ICSU Rio+20 (2011-2012) e, também, como membro do Comitê Executivo da ISA (International Sociological Association) (2002-2010). Sua trajetória nacional e internacional tem aberto portas para jovens pesquisadoras/es que têm como objetivo contribuir, ainda que minimamente, para o fortalecimento de debates que têm sido travados nas ciências sociais.

Entre 2015 e 2017, foi diretora da plataforma GenderInSITE (Gender in Science, Innovation, Technology and Engineering) que vislumbra a promoção de estratégias e políticas de impacto em paridade de gênero para as mulheres na ciência e áreas correlatas da tecnologia. Permanece colaborando ativamente com essa iniciativa internacional, o que demarca a transição de perspectiva de Alice Abreu, antes sobre a atuação das mulheres no campo de trabalho, e hoje, uma dedicação especial para a relação das mulheres na produção de conhecimento científico.

Por fim, vale destacar os prêmios recebidos e que trazem merecido reconhecimento à sua carreira: a. Ordem Nacional do Mérito Científico do Brasil em 2001; b. Palmes Académiques (Officier), du Ministère de la Jeunesse, de l’Éducation Nationale et de la Recherche da França em 2003; c. Prêmio Florestan Fernandes de Sociologia em 2009; d. Prêmio de Excelência Acadêmica Antônio Flávio Pierucci de Sociologia em 2013; e. Menção honrosa no Prêmio “Carolina Bori Ciência & Mulher” promovido pelo 2º Seminário “SBPC e as Mulheres e Meninas na Ciência” em 2020.

Sugestões de obra da autora:

ABREU, Alice Rangel de Paiva; HIRATA, Helena; LOMBARDI, Maria Rosa (Org.). 2016. Gênero e trabalho no Brasil e na França: Perspectivas interseccionais. Boitempo: São Paulo.

ABREU, Alice Rangel de Paiva et al. 2014. “Equidade de Gênero na Sociedade do Conhecimento no Brasil: presença feminina na ciência e tecnologia” in Document de travail du Mage, v. 18, p. 93-120.

ABREU, Alice Rangel de Paiva. 2003. “A (strong?) voice from the South: Latin American sociology today” in Current Sociology, v. 51, n. 1, p. 51-72.

ABREU, Alice Rangel de Paiva. 2001. “Estratégias de desenvolvimento científico e tecnológico e a difusão da ciência no Brasil” in Educação para a ciência: Curso para treinamento em centros e museus de ciência, p. 23-28.

ABREU, Alice Rangel de Paiva. 2000. Produção Flexível e Novas Institucionalidades na América Latina. Ed. UFRJ: Rio de Janeiro.

ABREU, Alice Rangel de Paiva. 1994. “Especialização flexível e gênero: debates atuais” in São Paulo em Perspectiva, v. 8, n. 1, p. 55-57.

ABREU, Alice Rangel de Paiva. 1986. O avesso da moda: trabalho a domicílio na indústria de confecção. Editora Hucitec: São Paulo.