CP21 – Sociedade e Universidade

Coordenação

Helena Sampaio (UNICAMP)
Rosana R. Heringer (UFRJ)

O ensino superior, tanto no plano internacional como no nacional, constitui um ator estratégico nas sociedades contemporâneas.

Mantém complexas relações com o processo de desenvolvimento econômico, com a produção de conhecimento científico, com a formação de quadros profissionais, com as crescentes demandas de democratização de oportunidades educacionais e construção da cidadania. O GT objetiva constituir um espaço para discutir as relações existentes entre as novas configurações do ensino superior e as mudanças que ocorrem em distintos graus nas sociedades nacionais. Os temas e pautas de pesquisas sobre ensino superior, sempre considerando os contextos locais, nacionais e globais são: (i) expansão e diversificação do ensino superior; (ii) ampliação das funções e raio de atuação do ensino superior; (iii) relações entre processos de globalização, mercantilização e ensino superior; (iv) crescente mobilidade de estudantes e docentes; (v) emergência de espaços transnacionais de ensino superior; (vi) análise comparativa de sistemas de ensino superior; (vii) políticas de expansão, de financiamento e de qualidade; (viii) ensino superior e estratificação social; (ix) articulação entre universidade e empresa; (x) ensino superior como objeto do conhecimento nas ciências sociais.

Propõe-se também discutir os procedimentos teóricos e metodológicos utilizados pelos cientistas sociais em suas investigações sobre as transformações em curso no ensino superior no país e no mundo. Busca-se, ainda, apontar para a especificidade do ensino superior como campo teórico e empírico de investigação e sua interface com outros campos consagrados na sociologia, como a sociologia das organizações, da ciência, das profissões, dos estudantes, do trabalho etc.

Atualidade, relevância e justificativa da proposta

O ensino superior, dada sua centralidade no processo de desenvolvimento socioeconômico e na dinâmica da democratização do conhecimento e da construção da cidadania nas sociedades contemporâneas, ocupa um espaço cada vez mais significativo nos trabalhos desenvolvidos por cientistas sociais.

A convite da SBS, nós, proponentes do GT: Educação Superior na sociedade contemporânea, escrevemos um artigo sobre “A institucionalização da pesquisa sobre ensino superior no Brasil”, publicado na Revista Brasileira de Sociologia | Vol. 06, No. 12 | Jan-Abr/2018. Nos diferentes itens trabalhados, incluindo as transformações do ensino superior no mundo e ensino superior como objeto de pesquisa e como campo de estudos na sociologia, buscamos demonstrar que o campo do conhecimento sobre o ensino superior está hoje praticamente consolidado. Com diferentes abordagens teóricas e metodológicas, o ensino superior é investigado em diferentes dimensões na contemporaneidade. Diversos grupos de pesquisa instalados em centenas de universidades espalhadas pelo globo mobilizam ampla rede de pesquisadores que produzem conhecimento sobre este tema. Também no Brasil constata-se a presença de pesquisadores e grupos de pesquisa que têm por tema o ensino superior.

Dentre os diversos temas abordados na sociologia do ensino superior, destacam-se os referentes ao funcionamento dos sistemas, como governança, financiamento, regulação e avaliação de sua qualidade; à sua configuração, com ênfase para a relação entre setor público e setor privado, as tendências simultâneas de isomorfismo e de diferenciação do sistema; ao fenômeno da estratificação horizontal e hierarquização do ensino superior, considerando-se os diferentes tipos de instituição, de cursos e de carreiras oferecidos, o perfil dos estudantes, a posição dos formados no mercado de trabalho etc.; aos processos de privatização e de mercantilização do ensino superior; aos processos de ensino e aprendizagem em contextos de massificação do ensino superior; ao clima institucional no contexto das universidades multiculturais e multiétnicas, dentre outros.

O GT focaliza a sociedade e a educação superior. A proposta do GT se justifica (a) pela importância em analisar as complexas e estratégicas relações que o ensino superior mantém com o desenvolvimento econômico, com a produção de conhecimentos técnicos e científicos, com as crescentes exigências socioeconômicas de democratização e de igualdade de oportunidade nas sociedades contemporâneas; (b) pela oportunidade que os pesquisadores sobre esta temática terão para apresentar os resultados de suas pesquisas; (c) pela necessidade de avançar o conhecimento nesse campo de pesquisas visando a formulação de proposições que possam contribuir para os rumos do ensino superior no país.

Vários países contam com políticas específicas para tornar seus respectivos sistemas de ensino superior provedores de recursos humanos, investindo maciçamente na formação de novas gerações de profissionais altamente qualificados. Ao mesmo tempo, introduzem reformas em seus sistemas de ensino com vistas a transformá-los em atores estratégicos no processo de inovação tecnológica e de competitividade econômica de seus países. Novas dinâmicas transformam constantemente o cenário da educação superior em todo o mundo, colocando novos desafios para o conhecimento no campo das ciências sociais, que serão sinteticamente apresentados a seguir.

Expansão. Inicialmente voltado para uma restrita clientela dotada de capital econômico e cultural, o ensino superior passou por um significativo processo de expansão ao incorporar gradativamente em escala mundial novos grupos sociais que até então estavam às suas margens. O acesso ao ensino superior praticamente duplicou nos quatro cantos do mundo. Em 1975, somavam pouco mais de 40 milhões de estudantes; em 1995, atingiu-se a cifra de 80 milhões e, no ano de 2007, segundo dados da Unesco, havia 153 milhões de estudantes no globo. Em 2014 o número de estudantes no ensino superior em nível global chegou a 207 milhões, também segundo a Unesco (UNESCO, 2017).

Em 1970 quase dois terços dos estudantes na educação superior estavam na América do Norte e Europa Ocidental. Em 2007, esse contingente de estudantes norte-americanos e europeus passou a representar apenas um quarto dos estudantes de ensino superior do mundo. A Ásia Oriental e Pacífico que respondiam, em 1970, por apenas 14% das matrículas globais de ensino superior, desde 2005 já detêm mais de 30%. América Latina e Caribe também dobraram sua participação, passando de 6% para 12% das matrículas de ensino superior do globo.

Hoje, a maioria dos estudantes da educação superior vive em países de média e baixa renda. Com expressivo crescimento de matrículas de ensino superior na última década, China e Índia concentram hoje os maiores contingentes de estudantes nesse nível de ensino do mundo, respectivamente 17 milhões (equivalente a 20% da população chinesa em idade de cursar o ensino superior) e 10 milhões (o que representa 10% da população indiana na faixa etária correspondente ao ensino superior) (Kishore, 2012 ; Yazhuo & Fengqiao, 2012).

No Brasil, em 2000, havia 2.694.245 estudantes matriculados no ensino superior; em 2018, o número havia mais que triplicado, saltando para 8.450.755 de matrículas (INEP, 2018). Esse crescimento evidente e notável em termos absolutos revela-se, no entanto, insuficiente quando confrontado, em termos relativos, à dimensão e às expectativas da população brasileira e em que pese o enorme aumento do investimento público e privado nesse nível de ensino.
Com o expressivo crescimento das matrículas de ensino superior um conjunto muito heterogêneo de estudantes em termos de idade, gênero, origem socioeconômica, cor, etnia, motivações, expectativas e projetos profissionais ingressou nas instituições de ensino superior. Em muitos países, as mulheres já correspondem à metade da população estudantil. No Brasil, elas representam 61% do total de matrículas (INEP, 2013). Pessoas mais velhas também voltam a procurar um curso de ensino superior, pressionadas pelas exigências do mercado de trabalho.

Diversificação

Para atender à crescente demanda de ensino superior, governos investem em políticas para promover a sua expansão e, dessa forma, incluir parcelas da população ainda excluídas desse nível de ensino. Em muitos sistemas de ensino superior, a expansão da oferta ocorre junto com a diversificação. Diferentes tipos de programas e modalidades de cursos são oferecidos, o que resulta em instituições bastante diferenciadas. O resultado dessas transformações – crescimento com diversificação – é o surgimento de sistemas internamente bastante heterogêneos e complexos, constituídos por IES com missões diferenciadas, voltadas para públicos distintos em termos de origem social e interesses. Os Community Colleges nos EUA, Fachhochschule na Alemanha, Institut Universitaires de Recherche na França e Polytechnics na Inglaterra são exemplos desse processo de diversificação institucional, no qual universidades convivem com instituições de diferentes tipos.

O Brasil tem uma experiência muito recente e tímida na diversificação do ensino superior. A oferta de ensino superior é ainda muito homogênea no país. No nível da graduação, o padrão que prevalece tanto nas IES privadas como nas públicas é o curso de bacharelado e o de licenciatura (formação de professores para o ensino básico), ambos de quatro anos. Os cursos tecnológicos são, na sua maioria, de três anos e os cursos de ensino a distância têm duração variada. Os cursos sequenciais, uma tentativa de diversificação do sistema, estão hoje em processo de extinção.

Ensino superior e globalização

O fenômeno de globalização é compreendido aqui como um processo multidimensional (econômico, político, cultural e acadêmico) e é uma das principais características das sociedades contemporâneas. O ensino superior é tanto parte importante do processo de globalização como é também por meio dele que se revelam as complexas relações entre os níveis global, regional, local e nacional. Nessa dinâmica, constata-se o surgimento de espaços universitários transnacionais, como o do processo de Bolonha, o da Universidade Mobilidade na Ásia e Pacífico etc. Simultaneamente, constata-se um processo crescente de desterritorialização dos serviços educacionais por meio da instalação de universidades estrangeiras e da participação de organismos multilaterais, como Unesco, Banco Mundial, OCDE, União Europeia etc., na formulação das agendas de discussão para o ensino de terceiro grau, as quais atingem em grau variado as sociedades nacionais.

Mobilidade

Desde as últimas décadas, aumenta a mobilidade de estudantes em âmbito internacional; em 2010, mais de 5 milhões de estudantes atravessaram suas fronteiras nacionais em busca de formação acadêmica em instituições estrangeiras. O fenômeno tanto impulsiona a formação de um mercado mundial de ensino superior, onde circulam milhões de estudantes, como acirra a concorrência entre países e instituições para atrair os estudantes e, assim, ampliar a sua presença e peso econômicos no contexto da globalização. Países asiáticos, como Singapura, Taiwan, China, Malásia, Japão, Coreia do Sul, dentre outros, e também alguns países europeus têm desenvolvido planos específicos com vistas a aumentar, nos próximos anos, a presença de estudantes e docentes estrangeiros em suas universidades.

Desafios do ensino superior no Brasil

O CT propõe também incluir em sua pauta de trabalho a análise dos efeitos das políticas de ensino superior adotadas nas últimas duas décadas e dos desafios que ainda precisam ser enfrentados nesse nível de ensino: expansão e democratização do acesso; políticas de inclusão e permanência; políticas de financiamento; papel do estado e do mercado para a promoção da qualidade das IES; formação superior e inserção no mercado de trabalho; internacionalização do ensino superior e busca pela excelência.

Apoiadores

Ana Cristina Murta Collares (UnB)
Ana Maria Alves Carneiro da Silva (Unicamp)
Andre Pires (PUC-Campinas)
Antonio Augusto Prates (UFMG)
Carlos Antônio Costa Ribeiro (IESP)
Carlos Benedito Martins (UNB)
Celia Caregnato (UFRGS)
Clarissa Eckert Baeta Neves (UFRGS)
Claudio Marques Martins Nogueira (UFMG)
Flavio Carvalhaes (UFRJ)
Gabriela de Souza Honorato (UFRJ)
Gregório Durlo Grisa (IFRS)
Hustana Maria Vargas (UFF)
Maria Ligia de Oliveira Barbosa (UFRJ)
Rogério Schlegel (Unifesp e Cebrap)
Silke Weber (UFPE)
Wilson Mesquita de Almeida (UFABC)

Comitês de Pesquisa